INQUÉRITO

Em resposta ao inquérito da minha querida Daniela, tentei responder assim.
As expressões e palavras coloridas correspondem às perguntas.

De altura tenho medo,
a não ser daquelas
a que o meu amor me leva.
Minhas sandálias são pequenas e leves.
Há nelas uma flor, vermelha.
Tenho medo, tenho medos,
da escuridão que me cerca
das ruas desertas, da saudade
e da solidão.
Tenho tantos medos
e penso em não tê-los mais.
Por isso, me desmancho
e me reconstruo
com um único objetivo:
ter o meu amor comigo
em serena quietude.
Se com ele falasse,
diria desse amor e da espera.
Diria da saudade que tenho

da sua voz e carinhos lentos
que ele faz.
Não sei falar de amor, não sei.
As palavras se embaralham, tantas.
De mim, sei falar menos ainda.
E do meu corpo, só gosto dos
intocáveis desejos que me animam.
Meu corpo não é. Eu sou.
Mas com ele brigo e brinco
sem profaná-lo
com feias palavras ou gestos.
Ele, meu corpo, não é.
No entanto, carrega-me
e sofre as minhas dores.
Meu corpo sofre a solidão
e chora nas madrugadas
em cama sem lado, vazia.
Ao centro, ao lado, eu,
apenas eu em banhos de
penumbra, de sonhos
e fantasias.
Todos os dias.
Sou eu e ele, o meu amor.
Ele lá, eu aqui,
envolvo-me
como ele me envolveria
toalha quente,
beijo quente
e suas mãos douradas.
O que me provoca e carrega
minha alma, nuvem leve,
olhos de criança feliz são
as palavras de amor que ele me envia
em correio alado, em asa de ave e
que transformam meu dia
em parque de diversões,
em loja de bichos de pelúcia,
meus brinquedos preferidos.
Os dias são longos e claros
e se me perco nas horas,
encontro-me em minhas palavras
porque nelas acredito, são minhas,
são eu mesma.
Acredito em mim, nas pessoas
felizes e amo todas elas.
E se tempestades enfrento,
gosto delas também
porque mostram meu frágil ser
impedindo-me de me lançar
a façanhas, abismos e caminhos impossíveis.
Minha única aventura é escrever,
e então, sim,
corro riscos, esportista
e ando em fios, equilibrista na vida.
Este é o meu prazer e minha companhia
Assim, brinco e choro,
esqueço os mórbidos medos,
o escuro, as cobras e lagartos
que a vida insiste em dispor
em minhas esquinas.
Disfarço e refaço meu caminho
escondo-me do medo nos livros
escondo-me dos jornais, transformo
cicatrizes em flores, tatuagem amarela
de antigas dores.
Sim, há dores pelo que não fiz,
pela saudade das ilhas que não me
contiveram, da terra-mãe
que me chama interminavelmente.
A saudade dos lugares onde nunca estive
transforma tudo em noite e sonho,
mesmo tendo os bolsos vazios,
vazios de poder.
Ah! se eu tivesse poder de primeiro-ministro
traria para este lado do mar
o meu amor que tão longe está
e nenhum dinheiro do mundo
me interessaria mais.
Seria rica, nababo de amor.
E descobriria em lâmpadas
o sabor dos beijos
que
nunca provei, até morrer,
às 23h59
de um dia qualquer,
mas não sem antes, conceber
dele, o fruto do mais doce amor.
Saramar

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